quarta-feira, 27 de junho de 2012

The Chills


Your tongue is sharp
but I miss the taste of it
You said time heals
there's not enough of it
Peter, Bjorn And John


p.s.: música que dá arrepios, literalmente.

quinta-feira, 21 de junho de 2012

21 de junho


 Estou confusa. Não no sentido que dói a cabeça e rasga neurônios. Não sei se quero muito ou se quero pouco, se preciso de mais ou de menos. Transformei-me naquilo que nunca desejaria ser: realizo uma meta de cada vez, sou pragmática, tenho um foco e depois de atingi-lo já não saberei mais de mim. Tornei-me parte da estrada por onde as vidas ligadas no piloto automático prosseguem, apertadas e competindo entre si. Continuo a dominar a direção e o sentido, mas a trajetória segue em movimento retilíneo uniforme. Até as lombadas já impregnaram no meu solo e nem sinto mais os altos e baixos: parecem todos planos. Se paro a fim de tomar um ar, me deparo com uma curva fechada que muitos enxergam, mas poucos têm tenacidade suficiente para contorná-la. Essa curva mexe muito comigo, mas ainda sim, faço parte dos muitos. 

segunda-feira, 11 de junho de 2012

Avôs

Fila de banco. Dois senhores com ar distinto, um atrás do outro. Os dois engravatados, respeitabilíssimos. O senhor de trás nota um desenho colorido nas costas da mão do senhor da frente e pergunta: 
– Neto? 
– Neta – diz o outro. 
– Eu também – diz o primeiro, mostrando um desenho nas costas da própria mão. 
– Ela diz que é uma borboleta. Eu não acho nada parecido com uma borboleta, mas vou discutir com ela? 
– A minha insiste que isto é um gato de chapéu, e não quer ouvir o contrário. 
– Não aceitam críticas. 
– No outro dia, eu disse: “Que bonito, você fez uma pintura abstrata...” Ela não quis saber de pintura abstrata. Era um sapo vermelho no meio de um lago azul, eu não estava vendo? 
– Elas ficam bravas. 
– Ficam. Só falta nos chamarem de burros. E quando a gente vai lavar a mão para tirar a tinta? 
– Fazem um escândalo. Estamos destruindo as suas obras de arte. 
– A sua pinta, o seu rosto também? 
– Pinta. Diz que é maquiagem. Há dias eu estava dormindo a sesta e quando acordei estava com o rosto todo pintado. Pó, batom, blush, tudo que ela pega da mãe dela. 
– A minha só usa o batom. Mas passa batom em todo o meu rosto, menos nos lábios. Na ponta do nariz, nas faces... Faz desenhos com batom na minha testa e exige que eu nunca mais lave o rosto. 
– Não é formidável? 
– É fantástico. 
– Vou confessar uma coisa. Eu não sabia o que era a felicidade até o dia em que minha neta desenhou cabelos na minha careca com tinta preta. Foi um escândalo em casa. Mas como, sujando a cabeça do vovô desse jeito?! Ela explicou que era para tapar a careca, para o vovô ficar mais bonito. Botaram ela de castigo, ameaçaram jogar fora as suas tintas, foi uma choradeira só. E eu feliz da vida. Olhe só, ainda tem um resto de tinta aqui... 
– Elas são maravilhosas... 
– Mas depois crescem. 
– Tem isso. Crescem depressa demais. Começam a achar avô chato... 
– Eu me vejo daqui a poucos anos andando atrás da minha e pedindo: “Não quer pintar a mão do vovô?” 
– É . “Pinta o rosto do vovô de palhaço, pinta”. 
– Vamos ter que pedir por favor. 
– E elas nada. E daqui a pouco são umas mulheres feitas... 
– A verdade é que ser avô dura muito pouco. 
– Muito. Temos que aproveitar o momento, que passa rápido. Aproveitar antes que desbote. 
– Como uma pintura na mão. 
– Isso. Olha, acho que aquele guichê ficou livre. 
– Vou lá. Muito prazer, viu? 
– Prazer. 
VERÍSSIMO, Luiz Fernando